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A colonização alemã no Espírito Santo - Primeira parte: a terra e a gente (I)

Venda de Karl Bullerjahn, em Santa Maria de Jetibá [In WERNECKE, Hugo. Viagem pelas colônias Alemãs do Espírito Santo. (tradução Erlon José Paschoal) Vitória: Arquivo Público do Espírito Santo, 2013, p.107]

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Capítulo I – O Espírito Santo


1. A terra[ 1 ]


O Espírito Santo é um dos menores estados brasileiros não só quanto à população, mas também quanto à superfície. Situado como está entre os grandes estados da Bahia, Rio de Janeiro e Minas Gerais, parece dever a existência mais a um capricho da história do que ao imperativo de uma necessidade.

Seu território tem 400 quilômetros de comprimento e pouco mais de 100 quilômetros de largura, formando uma faixa que se estende de 18º, 5' a 21º, 28' de latitude sul na borda oriental do grande planalto brasileiro, passando pelas encostas da serra dos Aimorés e de suas ramificações meridionais, pelas das serras do Espigão e da Chibata.

É uma região predominantemente montanhosa, cortada por numerosos cursos d'água, com florestas espessas. Ao norte, vai declinando, com certa regularidade, em direção à costa; e ao sul enruga-se em algumas serras que se alteiam até 1.400 metros. Só a orla marítima apresenta características acentuadas de uma planície que, entretanto, pouco se distende. Mas, acima de 20º, a planura se expande, penetrando mais no interior, especialmente no curso inferior do rio Doce, onde se espraia, coberta de lagos e pântanos.

O rio Doce se origina em Minas, irrompe, em cataratas, através da serra dos Aimorés, corta o Espírito Santo mais ou menos ao meio, sendo o maior rio desse estado. É navegável, embora com dificuldade, até as imediações da fronteira de Minas. São navegáveis, no curso inferior, por pequenas embarcações, o Santa Maria e o Itapemirim, que fluem ao sul, em direção à costa. A hidrografia é, assim, pouco favorável ao transporte.

A conformação da costa, ao contrário, favorece muito a navegação. O porto de Vitória, na baía do Espírito Santo, apesar da entrada um pouco difícil, é um dos melhores do Brasil.

No que diz respeito às condições pedológicas, existem duas zonas principais de cultura: uma formada pelas terras baixas, com aspecto tropical; outra, pelas terras altas, onde predomina o aspecto subtropical. A zona baixa que, estendendo-se ao longo da costa, ora se alarga e ora se encurta, avançando pelos vales dos afluentes do rio Doce presta-se bem para o cultivo do algodão, da cana de açúcar e da maior parte dos produtos tropicais. Na região alta, podem ser cultivados quase todos os produtos subtropicais e muitos da zona temperada. Em geral, a terra é muito fértil. As florestas contêm grandes reservas de madeiras de lei. Especial menção merece a riqueza em jacarandá, uma espécie de palissandro, e em peroba, madeira excelente para a feitura de móveis. Tanto quanto se sabe até hoje, não possui o Espírito Santo riquezas minerais em quantidades apreciáveis. A respeito nada se pode citar além da areia monazítica da costa.

Qualquer que seja, a situação com referência às riquezas naturais do estado, a extensão do território limita as perspectivas de desenvolvimento econômico. A superfície do Espírito Santo não vai além de 45.000 km²; é bem menor que a da Baviera e não muito maior que a de Hannover ou Silésia.

É de se levar em conta, entretanto, o estado vizinho de Minas Gerais, de subsolo muito rico. Está sendo concluída a construção do porto de Vitória, por onde se escoará o minério, a ser trazido pela Estrada de Ferro Vitória-Diamantina.

2. O povoamento


Os primeiros europeus que pisaram o Espírito Santo foram os portugueses, em 1535. Começaram a colonização fundando a cidadezinha de Espírito Santo — a atual Vila Velha. Só pouco mais tarde erigiram defronte, na ilha da baía do Espírito Santo, a atual capital do estado, Vitória.

A colonização progrediu pouco;[ 2 ] era dificultada, principalmente, pela animosidade dos íncolas que, apesar de todas as represálias, irrompiam, destruidores, dos esconderijos seguros da floresta, sobre as colônias dos brancos. Graças ao zelo evangelizador dos jesuítas, a civilização européia foi levada, pelo menos, a parte dos índios. Foram aldeados para a catequese,[ 3 ] e punha-se em prática um regime semelhante ao do Estado Jesuíta do Paraguai, mas sem o comunismo de lá. Os brancos eram, tanto quanto possível, afastados das aldeias da Companhia de Jesus. Os índios foram amoldados ao sedentarismo, foram-lhes ensinados artes e ofícios e agricultura. Os que se civilizavam, tornavam-se aliados na luta contra as tribos do interior. Com a expulsão dos jesuítas em 1758, perderam-se todos esses frutos. Os índios entregues a si mesmos, foram, em pouco, empurrados para as florestas, exterminados ou absorvidos pela população das colônias. Em 1750, contavam-se 40.000 índios civilizados, em 1856, somente 6.000.

A colonização lusitana, apesar do apoio nas aldeias jesuíticas, permaneceu, como se iniciara, na orla marítima, onde o terreno se prestava excelentemente ao cultivo da cana de açúcar e do algodão e onde era possível desenvolver-se a exploração agrícola baseada no trabalho escravo, como em Pernambuco. Já em 1662, chegavam ao Espírito Santo os primeiros negros.[ 4 ] Quanto às atividades açucareiras, as informações existentes permitem que se deduza ter havido 76 engenhos grandes e 68 menores.[ 5 ] Conforme censo da época,[ 6 ] o Espírito Santo possuía, em 1856, uma população de 49.000 almas, das quais 12.000 escravos e 37.000 livres. Todos os escravos eram, naturalmente, negros ou mestiços de negro. A população livre se distribuía, segundo a raça, como segue:

Brancos            14.314
Índios 6.051
Mestiços 13.825
Pretos 2.626
Total 36.816

Na conformidade desses dados, 39% da população era branca; é provável, porém, que a porcentagem fosse menor, uma vez que, de acordo com a experiência dos recenseamentos, muitos mestiços procuram passar por brancos.

Das pessoas livres em atividade, eram:

Fazendeiros 9.759
Comerciantes 364
Artífices 889
Funcionários públicos     161
Sacerdotes 22

Quase não existia, portanto, a divisão profissional do trabalho. Em 1854 e 1855, havia, apenas, 226 empresas comerciais e industriais. Predominava, assim, uma estrutura econômica fechada, que produzia algo para exportação.

Em 1859, Handelmann escrevia: "O Espírito Santo, juntamente com a região meridional da Bahia, forma aquela faixa costeira que ficou mais atrasada, após 300 anos de colonização".[ 7 ] Bem pouco se tinha alcançado até então. Mas, segundo parece, pôs em risco esse pouco, a libertação dos escravos, iniciada em 1831 com a proibição do tráfico negreiro, e concluída em 1889. Lançou por terra a antiga organização do trabalho, muitas explorações agrícolas decaíram. Os libertos, em sua maioria, abandonaram as fazendas, espalharam-se pelas florestas e passaram a viver na forma mais rudimentar de economia fechada.

Mas nova vida já ia despontando sobre as ruínas do velho sistema. Os imigrantes teutos que começaram a chegar na década dos 40, engrossando o número na dos 70, e os italianos que afluíram nos anos de 1877 a 1895,[ 8 ] lançaram-se, vigorosamente, à colonização das florestas serranas.

A população atual do Espírito Santo é, provavelmente, de 300.000 almas.[ 9 ] Toda a região ao norte do rio Doce, metade mais ou menos, do território do estado, é escassamente povoada. Aí, onde ainda vagueiam selvagens — os aimorés ou botocudos — há à margem do São Mateus, apenas, algumas povoações pequenas de aborígenes, hoje, na maioria, miscigenados. São poucos os negros ou índios, sem mestiçagem, que se encontram entre eles; e, pondo de lado os colonos alemães e italianos,[ 10 ] é também muito reduzido o número de brancos puros.

A maior parte da população vive dispersa em unidades familiares ou aldeias minúsculas. Segundo dados oficiais, há no Espírito Santo mais de 200 localidades, entre as quais 12 cidades.[ 11 ] A maior delas, porém, a capital do estado, Vitória, tem pouco mais de 25.000 habitantes. É a maior praça comercial do estado e a sede de algumas casas de negócio importantes. Está sendo modernizada; foi dotada de luz elétrica e de bondes e, conforme mencionamos, grandes instalações portuárias estão em construção. Cachoeiro do Itapemirim, situada à margem do Itapemirim, é a segunda cidade em importância. É o centro comercial do sul. A seguir, vem a cidade de Porto do Cachoeiro de Santa Leopoldina, com 1.200 habitantes; é banhada pelo Santa Maria, que desemboca na baía do Espírito Santo.


3. Produção e comércio


Com a supressão do tráfico negreiro e da escravatura a cultura da cana de açúcar e a do algodão foram sendo suplantadas pela exploração cafeeira.

Em 1863, o relatório do presidente Costa Pereira Júnior dá, sobre o retrocesso da produção açucareira, os seguintes números:[ 12 ]

Exportação de açúcar

1844       324.000 arrobas (15 quilos)
1845 226.000 arrobas (15 quilos)
1852 117.000 arrobas (15 quilos)
1861 22.000 arrobas (15 quilos)


Mas a plantação de café fez grandes progressos. Aliás, essa cultura desenvolveu-se muito noutras regiões brasileiras, no decênio de 1840. Seguem, abaixo, dados sobre a exportação cafeeira do Espírito Santo:

1845                          32.000 arrobas
1852 95.000 arrobas
1861 224.000 arrobas

Esse fato parece confirmar a observação — assim se diz no relatório citado — que mais de um viajante fez na América, a de que a cultura do açúcar é, de todos os ramos da economia agrícola, aquela que melhor se ajusta ao trabalho escravo. Sua decadência, a partir da década de 1840, se explica, segundo o relatório, pela proibição, estabelecida anteriormente, do comércio de escravos, que, no momento, passara a ser reprimido com severa vigilância. São, também, apontados como causas a praga de lagarta, que os produtores de açúcar tiveram de enfrentar, e os preços correntes.

Com o povoamento da região alta pelos imigrantes alemães e italianos, a cultura do café passou a ter absoluto predomínio. Ficou demonstrado, nas terras altas, ser o produto de exportação mais lucrativo. Foram exportadas, do Espírito Santo,[ 13 ] em 1894, 1 milhão e 400 mil arrobas de café, ou seja 21 milhões de quilos; em 1912, 3 milhões de arrobas, isto é, 45 milhões de quilos[ 14 ] (só de Vitória, 1 milhão e 900 mil arrobas — 28 milhões de quilos). Uma quantidade minúscula em face da produção total do Brasil de mais de 10 milhões de sacos (600 milhões de quilos)! É de pouco valor a exportação espírito-santense de outros produtos; limita-se à madeira, areia monazítica etc.

Desenvolveu-se, assim, a monocultura, perigosa para o estado, os comerciantes e os grandes produtores, mas não tanto para os colonos, como veremos adiante.

Excetuados alguns reveses isolados, o comércio progrediu muito. Durante o ano de 1863, quando o mil réis valia 27 pence, a situação era a seguinte:

                   Exterior       Cabotagem        Soma (mil réis)
Exportação    87.000    431.000 518.000
2.000               694.000 696.000 1.214.000

A soma da exportação com a importação, levantadas pela estatística, não alcançava, ainda, 3 milhões de marcos; todo o movimento comercial montaria, dificilmente, a mais de 5 milhões.

Segundo o levantamento estatístico de 1911, quando o câmbio estava a 16 pence, o intercâmbio com o exterior se apresentava assim:

Exportação            24,7 milhões de mil réis
Importação 4,8 milhões de mil réis

Se for acrescentada a exportação para os estados vizinhos, a saída total de mercadorias ultrapassará 25 milhões de mil réis. Admitindo-se que a importação, em virtude de remessas de juros para o exterior etc., oscile entre 20 e 25 milhões de mil réis, poderemos estimar o atual comércio exterior em cerca de 50 milhões de mil réis, ou seja 65 a 70 milhões de marcos, o que representa, para a população, 200 a 250 marcos per capita.

Só no setor de exportação se observa a monocultura; ao lado da exploração cafeeira, há uma extensa produção para satisfazer o consumo interno. Os produtos mais importantes são: tubérculos, feijão, milho, carne, toucinho, queijo e manteiga. A bem dizer, não possuem mercado interno. São produzidos domesticamente. São consumidos pela mesma comunidade minúscula que os produz.

O Espírito Santo, portanto, ainda apresenta estrutura econômica idêntica à dos países novos; isto é, a produção doméstica se liga, estreitamente, àquela destinada à exportação, a economia familiar se entrelaça com a mundial. Observa-se a falta, quase absoluta, do estágio intermediário — a produção para o mercado local e, por conseguinte, do circuito econômico interno.

É o que se revela nos meios de transporte. Uma navegação fluvial e costeira inexpressiva, os muares e os carros de boi são os meios de transporte dentro do estado. Entretanto, o navio de vapor e a linha férrea põem-se em contato com o tráfico internacional. Desde 1910, a cidade de Vitória está ligada, por estrada de ferro, a Niterói, e, por intermédio desta ao Rio de Janeiro. A viagem leva 21 a 22 horas.[ 15 ] A estrada pertence a uma companhia inglesa, a Leopoldina Railway Co. Há pouco tempo, concluindo-se a via férrea que vai de Vitória a Diamantina, vinculando-se, assim, a capital com a rede ferroviária de Minas. O estado possui, ao todo, 550 quilômetros de trilhos. Os navios do Lóide Brasileiro, que navegam, regularmente, entre os portos brasileiros mais importantes, transportam passageiros de Vitória ao Rio, em 24 horas. Vitória, por sua vez, tem contato direto com empórios ultramarinos.

A organização do comércio corresponde a essas condições. Na capital existem apenas algumas casas comerciais importantes, em cujas mãos quase que se concentram exportação e importação; só os comerciantes de Porto do Cachoeiro e de Itapemirim fazem-lhe concorrência. No interior encontram-se inúmeros pequenos comerciantes, os vendeiros, que obtêm os artigos das firmas importadoras, para distribuí-los à população; além disso, compram dos seus fregueses pequenas partidas de café, para entregá-las, posteriormente, a essas firmas. Nota-se, ainda, um comércio ambulante, em decadência, oriundo de Minas, o qual provê o estado, principalmente, de gado, artigos de montaria e fumo.

O crédito desenvolveu-se pouco. Há em Vitória, uma filial do London and River Plate Bank, fundada em 1910. Seus depósitos elevaram-se a mais de 1 milhão de mil réis. Os juros cobrados oscilam entre 9 e 10%, em casos de risco maior, entre 13 e 14. Em 1911, surgiu o Banco Hipotecário e Agrícola Francês.[ 16 ] Do seu capital, cujo valor nominal é de 10 milhões de francos, só foi coberta a décima parte, um milhão, apesar de o estado se ter obrigado a uma garantia de juros de 5%. O Banco colocou em França obrigações de 5%, tipo 81 por 40 milhões de francos. Seus empréstimos se têm destinado, principalmente, a hipotecas e empreendimentos industriais.[ 17 ]

Parece, porém, não ter chegado, ainda, o momento propício ao desenvolvimento industrial, que o estado procura incentivar com isenção de Impostos, doação de terrenos etc. Necessariamente, uma indústria terá sempre de lutar contra os maiores obstáculos, numa economia como a do Espírito Santo, em que é quase nulo o mercado interno, seja de mercadorias ou de trabalho.

4. Política e finanças


O Espírito Santo foi incorporado ao império colonial português como feudo, como capitania.[ 18 ] Foi vendido, várias vezes, pelos respectivos donos, sendo, por fim, comprado pelo próprio rei, em 1718. Este colocou o território sob a direção de funcionários (capitães-mores), subordinados ao governador geral da Bahia. Em 1803, esses funcionários foram substituídos por governadores que, de 1809 em diante, não mais se subordinavam à direção da Bahia de modo que o Espírito Santo se tornou província autônoma. Com a reforma administrativa do Império, foi dotado de ampla autonomia administrativa. Após a queda da monarquia, em 1889, o Brasil, seguindo o modelo estadunidense, transformou-se em federação. O Espírito Santo passou, assim, a ser um estado. É representado, no Congresso Federal, por três senadores e quatro deputados.

A organização do estado é a seguinte:[ 19 ] À frente está o presidente, eleito por um período de 4 anos, por voto direto. Tem extensos poderes. O direito de veto embora não seja absoluto, é bastante amplo. Incumbe-lhe, exclusivamente, a nomeação de funcionários públicos, e pertence-lhe o direito de veto. O presidente pode prorrogar a lei orçamentária, quando o Congresso, por qualquer motivo, não se tenha pronunciado sobre a matéria. O órgão legislativo é o Congresso, formado de uma só câmara; é constituído por 25 deputados; não há senado. O estado é dividido em municípios cujos negócios são geridos por uma câmara municipal, presidida pelo prefeito eleito por escrutínio direto.

No Espírito Santo, apesar de todos os princípios democráticos, governa-se oligarquicamente, como é regra na América do Sul. No fim, apenas algumas famílias dominam o estado. É significativo que os três irmãos do ex-presidente do estado, Jerônimo Monteiro, presidente atual do Congresso, exerçam as seguintes funções: um é o bispo do estado, outro, diretor fiscal do Banco Francês, e o terceiro, senador federal no Rio.

A vida pública não se diferencia do padrão vigorante na América do Sul. A Justiça é influenciável e insegura. Entretanto, se muitos crimes não se punem, uma das causas reside nas péssimas condições de transporte, que limitam, bastante, o poder das autoridades.

Não parece haver muito escrúpulo relativamente às finanças públicas. Lembrarei, a propósito, um trecho do relatório do presidente Monteiro,[ 20 ] em que se acusa o antecessor de ter apresentado, ao passar o governo, como valor da dívida pública, 426.000 mil réis, quando o montante real era de 1.170.000 mil mil réis. É interessante o que se diz no relatório sobre o hábito da gestão passada, de efetuar os pagamentos, com o máximo de impontualidade. Agora, acabou-se com esse sistema odioso e execrando, de submeter funcionários e empreiteiros de obras públicas ao arbítrio de mandantes, que ora os forçavam a deduzir de seus recebimentos, quantias apreciáveis, a favor de intermediários e ora os faziam esperar, indefinidamente, por pagamento, coagindo-os, assim, a se tornarem correligionários políticos ou tirando vinganças abomináveis.[ 21 ]

Quase toda a receita do estado decorre da exportação de café, como se verifica da proposta orçamentária de 1913.

Imposto de exportação           3,2 milhões de mil réis
Imposto de selo 0,6 milhões de mil réis

Toda colheita malograda e toda queda dos preços do café significam prejuízo imediato para o fisco. Quando o preço do café de 13 a 20 mil réis, em 1896, baixou a 6 a 10, em 1900, e a 5 a 7, em 1904, as receitas do estado diminuíram da seguinte maneira:[ 22 ]

1896                   5,4 milhões de mil réis
1900 2,9 milhões de mil réis
1904 2,3 milhões de mil réis

O Tesouro que, em 1894, contraíra dívidas volumosas, ficou em aperturas. Esteve sob ameaça de bancarrota. O crédito do estado evaporou-se. Todavia, um acordo com os credores complacentes evitou a catástrofe. A situação melhorou e as receitas ordinárias elevaram-se, conforme o quadro abaixo:[ 23 ]

1908                   2,7 milhões de mil réis
1909 2,6 milhões de mil réis
1910 3,1 milhões de mil réis
1911 4,8 milhões de mil réis
1912 5,3 milhões de mil réis

As dívidas não diminuíram. Em 23 de maio de 1912 importavam em 39,2 milhões de francos, distribuindo-se da seguinte maneira:[ 24 ]

Dívida externa 29,5 milhões de francos
Dívida interna 9,4 milhões de francos
Dívida flutuante, etc              0,3 milhões de francos
Total 39,2 milhões de francos

Além das rendas estaduais, devem ser levadas em conta as receitas municipais, que decorrem, principalmente, do imposto de indústria e profissões, cuja incidência mais importante é sobre as casas comerciais.[ 25 ] Em 1911, receitas dos municípios de maior destaque eram:

Vitória 257.000 mil réis
Cachoeiro do Itapemirim                 90.000 mil réis
Santa Leopoldina 47.000 mil réis
Santa Teresa 28.000 mil réis
Santa Isabel 21.000 mil réis

5. Generalidades


As condições políticas e sociais do Espírito Santo parecem demonstrar, em seu conjunto, a ação debilitante do clima tropical. Observa-se, por certo, pujante desenvolvimento em muitos setores da vida econômica. A grande massa da população nativa vive, como dantes, indolentemente, em meio às condições mais rudimentares. Produz pouco para o mercado e contenta-se com um nível de vida baixo; vegeta na anarquia quase completa, vítima da ignorância crassa, prisioneira de superstições infantis e afastada do circulo de influência das forças civilizadoras e, em particular, da autoridade política. Esta, dominada pela incúria e por todas as formas imagináveis de corrupção, embora revestida da pomposa aparência republicana, leva uma existência fantasmagórica e parasitária.

Este triste estado de cousas prefigura o sombrio destino que aguarda os imigrantes alemães, fortes e operosos? A exposição que se segue pretende responder à pergunta.

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NOTAS


[ 1 ] Mapa Topográfico da Província do Espírito Santo — Marques, págs. 59 e segs. — Annuaire du Brèsil, págs. 653 e segs. — Sievers, págs. 207 e segs. — Walle, págs. 1 e segs.
[ 2 ] Handelmann, pág. 441.
[ 3 ]  Itapemirim, hoje a praça comercial mais importante do sul, originou-se desse aldeamento.
[ 4 ] Marques, pág. 58.
[ 5 ] Marques, pág. 83.
[ 6 ]  Marques, pág. 83.
[ 7 ]  Handelmann, pág. 441.
[ 8 ]  Rizzelto, pág. 86.
[ 9 ]  Annuaire du Brésil, pág. 667, dá 383.569. Não sabemos como foi possível chegar-se a esse número, sem o devido recenseamento.
[ 10 ]  O cônsul italiano em Vitória estimou em 35 a 45 mil o número de italianos no Espírito Santo, em 1903. Rizzelto, pág. 89.
[ 11 ] Annuaire du Brésil, pág. 667.
[ 12 ]  Págs. 43 e segs.
[ 13 ] Mensagem, de 1895, do presidente Moniz Freire, pág. 8.
[ 14 ]  Segundo estimativa de fonte competente.
[ 15 ]  Partida pela manhã, de Vitória, às 10 h 15, chegada a Niterói na manhã seguinte, às 7 h 25; ida e volta, três vezes por semana.
[ 16 ]  Annuaire du Brésil, pág. 672.
[ 17 ]  Balanços do Banco.
[ 18 ]  Wappäus, pág. 1.711.
[ 19 ]  Constituição Política do Estado do Espírito Santo, Vitória, 1913.
[ 20 ]  Monteiro, pág. 22.
[ 21 ]  Monteiro, pág. 497.
[ 22 ]  Annuaire du Brésil, pág. 669.
[ 23 ]  Apud um relatório não publicado do Banco Hipotecário e Agrícola.
[ 24 ]  Annuaire du Brésil, pág. 672.
[ 25 ]  Regulamento para a cobrança dos impostos municipais. Santa Isabel, Vitória.

Ernst Wagemann (autor) nasceu em 18 de Fevereiro de 1884, em Chañarcillo, Chile, faleceu em 20 de Março de 1956, em Bad Godesberg, Alemanha. Foi economista político e estatístico muito atuante na Alemanha a partir dos anos de 1920. Para mais informações sobre o autor clique aqui.
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